Texto: Esmeralda Angelica
A advogada Bruna Cristina Santana de Andrade percebeu que, do ponto de vista jurídico, a população LGBTQIA+ era a mais marginalizada, por dois motivos: o primeiro porque a construção de alguns dos direitos voltados para o grupo aconteceu há apenas 10 anos, e o segundo “porque é a forma como os direitos da comunidade foram construídos foi diferente dos demais direitos; e o Brasil é um país extremamente legalista (que não questiona se leis estão adequadas ou não à realidade)”, explica a advogada.
A partir dessa demanda, em 2018, nasceu a Bicha da Justiça, uma startup social que tem o objetivo de informar advogados e a própria população LGBTQIA+ sobre seus direitos. Segundo Bruna, desde a criação, já foram mais de 10 mil pessoas atendidas, e a plataforma já conta com 30 profissionais. “Com o tempo, descobrimos que não adiantava educar a população, se quase 80% das pessoas que foram vítimas de algum tipo de preconceito no Brasil deixavam de procurar seus direitos, por falta de referência de profissionais jurídicos — advogados que fossem engajados com a causa e que não revitimizassem o cliente. Nesses casos, é fundamental encontrar um profissional que não seja homofóbico e considere a sua dor”, esclarece.
Objetivos, cursos e formações
Os três principais propósitos da Bicha da Justiça, segundo Bruna, são: gerar informação sobre direitos de forma acessível através das plataformas digitais; inclusão jurídica da comunidade LGBTQIA+ (para que a mesma possa se defender em situações menos complexas); e empregabilidade — o negócio possui um processo de formação dos profissionais jurídicos que desejam trabalhar com esses direitos.
“Esses profissionais acabam atuando em conjunto e viram referências locais, o que também gera uma fonte de renda para todos que trabalham associados à plataforma”, conta. Portanto, a finalidade dessa formação é preparar os advogados para prestarem um atendimento humanizado para a população LGBTQIA+.
Os outros cursos são voltados para a comunidade, para que eles possam conhecer e exercer seus direitos, sem que precisem de um profissional; é o caso do curso de retificação de nome e gênero, destinado a pessoas trans.
“Também temos cursos destinados a empresas, é uma pegada mais corporativa, são palestras, formações, treinamentos e workshops”. A assessoria acontece de forma simples: Bruna explica que existe um canal de “fale conosco” em todas as mídias sociais; a pessoa interessada preenche um formulário e, a partir deste primeiro contato, um dos profissionais atende à demanda.. Desta forma, clientes de todos os estados podem recorrer aos serviços (a empresa é sediada em São Paulo).
Onde atende e quais as ocorrências
A empresa atende em todo o território nacional, mas já ampliou seus horizontes para fora do país. “Temos muitas pessoas atendidas fora do país, via plataforma. Não há limites territoriais pra Bicha, ela tem essa alcance mundial, mas o foco de atendimento são os brasileiros”, explica.
Os casos mais comuns atendidos pela startup são de LGBTfobia, como violência no ambiente de trabalho e consumo, retificação de nome e gênero. Questões familiares também são recorrentes como dupla maternidade, licença maternidade, casamento e divórcio e também adoção.
A assessoria não é oferecida de forma gratuita, no entanto, existem programas e projetos desenvolvidos sem custo — é o caso do projeto Orgulho do Meu RG, lançado neste mês do orgulho LGBTQIA+, no qual a startup busca retificar sem custo algum nome e gênero de pessoas trans; o programa é patrocinado por empresas.
Desafios
Por atender o público LGBQTIA+, Bruna e sua sócia Flávia Maria Santos lembram que sofreram preconceito no começo: “Participamos de algumas rodadas de investimento para captar recursos, os investidores não entendiam muito a nossa proposta, nosso modelo de negócio, e isso foi desanimando bastante, porque embora a gente tivesse validado com o público e soubesse que era uma dor real que estávamos resolvendo, isso tudo foi um dificultador significativo”.
Em 2018, aconteceu a competição Startup Show, a maior competição de startups do Brasil e, com a ajuda de seu público, a Bicha da Justiça venceu por voto popular. “Isso renovou nossas expectativas porque mesmo que o mercado, os investidores, os mentores entendessem que não era uma boa, nosso público entendeu o contrário”.
Conheça o Bicha da Justiça: https://bichadajustica.com/