O “S” do ESG: como gerenciar melhor as questões sociais da sua empresa

Conheça os desafios e tendências do pilar Social na discussão sobre ESG.

Por: Leandro Machado

A crescente conscientização sobre a importância do ESG tem levado as empresas a repensarem suas estratégias de negócios e a considerarem o impacto de suas atividades em todas as dimensões.

No entanto, a dimensão social tem sido um desafio para muitas empresas e vem ganhando cada vez mais destaque no cenário corporativo. Como é o caso da Natura, que lançou há cerca de um mês mais uma edição da pesquisa IDH-CN, uma das formas que a gigante de cosméticos encontrou para medir o impacto social provocado por ela em sua rede de revendedoras e que expliquei melhor nesse artigo publicado há cerca de um mês.

O que o S do ESG envolve?

O “S” do ESG refere-se a questões sociais que uma empresa deve considerar em suas operações e estratégias de negócios, dentro e fora dela. Isso inclui, mas não se limita a, questões como direitos humanos, relações de trabalho, saúde e segurança dos funcionários, diversidade e inclusão, impacto nas comunidades de entorno, entre outras.

O aspecto social do ESG também visa corrigir, de alguma maneira, injustiças sociais nos ambientes em que as empresas operam. Atualmente as organizações enfrentam um número crescente de questões de justiça social que podem gerar riscos aos negócios, incluindo expansão de direitos trabalhistas, igualdade racial e de gênero, combate ao trabalho infantil e efeitos ambientais na saúde das pessoas.

E é por isso que o contexto também importa: uma empresa que opera no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais terá algumas questões sociais distintas de outra empresa operando na Serra Gaúcha, por exemplo.

Além do contexto, o setor da economia e a maneira como as empresas operam pode ter um grande impacto nessas questões. Portanto, a depender de múltiplos fatores, uma boa gestão da dimensão social pode significar tomar medidas em direção a fechar o gap salarial existente entre homens e mulheres, aumentar o número de pessoas negras em posições de liderança ou impulsionar o desenvolvimento econômico de comunidades de entorno.

As principais questões sociais hoje em dia para as empresas, em linhas gerais, são:

  • Diversidade, equidade e inclusão;
  • Desenvolvimento econômico e social das comunidades de entorno;
  • Saúde e segurança dos colaboradores;
  • Direitos trabalhistas e salário justo;
  • Combate ao racismo e ao assédio moral/sexual.
  • Gestão da cadeia de suprimentos

Por que os aspectos sociais se tornaram tão relevantes ultimamente?

O movimento ESG evoluiu de práticas de investimento socialmente responsáveis ​​e sustentáveis ​​que surgiram pela primeira vez em meados da década de 1970 e se tornaram mais difundidas durante a década de 1990 e início dos anos 2000.

Em muitos casos, as ações ESG se concentravam basicamente na compreensão dos riscos relacionados ao clima e em sua mitigação. Mas, desde o início da pandemia de COVID-19, os fatores sociais do ESG parecem ter ganhado mais destaque, como demonstram diversas pesquisas, dentre elas uma realizada pela CAUSE e Instituto Locomotiva há cerca de um ano.

Nesse contexto, os aspectos sociais se tornaram cada vez mais relevantes devido a pelo menos dois fatores. Primeiro, a crescente conscientização e expectativa dos stakeholders sobre a responsabilidade social das empresas. Segundo, a evidência concreta de que a má gestão dos aspectos sociais pode levar a crises corporativas, como vimos recentemente com as vinícolas de Bento Gonçalves e com o Carrefour, há cerca de três anos.

Desafios da dimensão social

Mas ainda que os aspectos sociais estejam ganhando mais espaço nas discussões, os desafios não são triviais. É o que mostra um estudo feito pela consultoria KPMG e o International Regulatory Strategy Group do Reino Unido. Dentre os principais desafios apontados pelo relatório, estão:

1- Volume e inconsistência de estruturas e medições: A falta de um conjunto comum de princípios e padrões dificulta a comparação do desempenho social entre empresas e a avaliação de seu progresso ao longo do tempo.

2- Impacto social versus retornos econômicos: A crença de que a entrega de impacto social está em desacordo com os retornos econômicos pode impedir que o capital flua para os mercados focados em ESG, retardando o ímpeto para alcançar um conjunto coerente de princípios e padrões sociais.

3- ‘Social washing‘: O risco de ‘social washing‘ é maior para os investidores do que o ‘green washing‘. As questões sociais são frequentemente consideradas qualitativamente, em contraste com a abordagem quantitativa adotada para muitas questões ambientais.

4- Falta de consenso global: Não há consenso global consistente sobre quais resultados sociais devem ser priorizados e como a implementação de objetivos sociais compartilhados, como os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, deve ser alcançada. Isso reflete, em parte, como é difícil alcançar um consenso global sobre os objetivos e a implementação, respeitando as preferências ou normas culturais e acomodando questões específicas que afetam países em particular.

5- Classificações e tecnologia ESG: O volume e a inconsistência dos relatórios ESG criam desafios para as partes interessadas compararem as empresas. Como os dados relativos a questões sociais são frequentemente qualitativos, é significativamente mais difícil para as agências de classificação ou tecnologias de reporte ESG conseguirem fornecer classificações confiáveis ​​para investidores e outros stakeholders.

Tendências no Social

Se já dá pra ver e sentir o maior interesse das empresas pela dimensão social e seus desafios, o estudo da KPMG também identifica as principais tendências nesse campo e que podem ajudar quem está buscando um direcionamento para sua estratégia ESG.

As tendências emergentes no componente social do ESG incluem um foco crescente na diversidade e inclusão, um maior reconhecimento da importância do engajamento com a comunidade e um aumento na demanda por transparência nas práticas sociais das empresas. Outras tendências são:

1- Ambiental como um multiplicador de força do Social: Embora haja uma ligação clara entre os impactos ambientais e sociais que as empresas podem ter, as implicações financeiras ou de mercado dos impactos ambientais muitas vezes parecem ter uma prioridade maior do que o social, mesmo quando a mesma atividade é a causa de ambos. O foco nas mudanças climáticas está aumentando a conscientização sobre como os resultados sociais e os fatores ambientais estão ligados.

2- Aumento das divulgações voluntárias: As empresas fazem inúmeras divulgações voluntárias, muitas vezes de acordo com estruturas e objetivos definidos por partes não-governamentais. Os regimes de divulgação voluntária são louváveis e podem substituir os requisitos regulatórios formais em algumas circunstâncias. Mas se “o mercado” não for capaz de se aglutinar em torno de um conjunto apropriado de tais regimes voluntários, há riscos de fragmentação, de custos de conformidade mais altos do que o necessário e de que os impactos captados por tal divulgação não sejam necessariamente aqueles em que sociedade mais ampla tem interesse.

3- Participação do Governo: É amplamente aceito, na maioria das jurisdições, que o estado tem um papel a desempenhar na obtenção de resultados sociais. Os governos têm vários mecanismos disponíveis para desempenha-los, além da introdução de leis para incentivar a prática empresarial socialmente responsável, incluindo incentivos fiscais, melhor acesso a financiamento para empresas que lidam com questões sociais e facilitação comercial para empresas com foco em resolver questões sociais.

Maneiras tangíveis de avançar o “S” do ESG

Com o interesse aumentado pelas questões sociais, ainda que essa seja a dimensão menos madura da trinca Ambiental-Social-Governança, as empresas têm buscado se fortalecer nessa frente. Aqui estão cinco maneiras tangíveis – algumas mais fáceis, outras de maior complexidade – de avançar o “S” do ESG na sua organização.

1) Construa uma matriz de materialidade: A matriz de materialidade é uma ferramenta essencial para identificar e priorizar questões sociais que são significativas para a empresa e seus stakeholders. Ela ajuda a empresa a entender quais questões têm o maior impacto em suas operações e quais são mais importantes para seus públicos. Ao construir uma matriz de materialidade, as empresas podem focar seus recursos e esforços nas áreas que terão o maior impacto social, ao mesmo tempo em que atendem às expectativas de seus stakeholders.

2) Transforme as comunidades de entorno de “dependentes” em “parceiros de negócios”: As empresas podem criar valor compartilhado ao transformar as comunidades em que operam de meros dependentes para parceiros de negócios. Isso pode ser feito por meio de iniciativas como o desenvolvimento de programas de treinamento e capacitação para membros da comunidade, a criação de oportunidades de emprego local e a promoção de negócios locais por meio de sua cadeia de fornecimento. Ao fazer isso, as empresas não apenas melhoram a vida das pessoas nessas comunidades, mas também fortalecem sua própria posição e reputação.

3) Desenvolva uma estratégia robusta de DEI (Diversidade, Equidade e Inclusão): A diversidade, equidade e inclusão são fundamentais para a criação de um ambiente de trabalho saudável e produtivo. As empresas podem utilizar a ciência comportamental para identificar e superar vieses inconscientes e promover uma cultura de inclusão. Isso pode incluir a implementação de treinamentos de viés inconsciente, a criação de políticas de recrutamento e promoção justas e a promoção de um ambiente de trabalho onde todos se sintam valorizados e respeitados.

4) Estabeleça uma política de direitos humanos ampla: Uma política de direitos humanos ampla é uma declaração clara do compromisso de uma empresa com o respeito aos direitos humanos em todas as suas operações. Isso pode incluir o compromisso de não discriminação, o respeito ao direito ao trabalho digno e seguro, e o compromisso de não se envolver ou apoiar violações dos direitos humanos. Ao estabelecer uma política de direitos humanos, as empresas podem demonstrar seu compromisso com a ética e a responsabilidade social.

5) Transforme-se em uma empresa anti-racista: No contexto brasileiro, onde o racismo estrutural é uma questão premente, as empresas têm um papel crucial a desempenhar na promoção da igualdade racial. Isso pode ser feito por meio de uma série de ações, como a implementação de políticas de recrutamento e promoção que promovam a diversidade racial, a realização de treinamentos de sensibilização sobre o racismo e a promoção de uma cultura corporativa que valorize e respeite todas as raças. Ao se tornar uma empresa anti-racista, as empresas não apenas contribuem para a luta contra o racismo, mas também se beneficiam da riqueza de perspectivas e experiências que uma força de trabalho diversificada pode trazer.

Conclusão

A crescente conscientização sobre a importância do ESG tem levado as empresas a repensarem suas estratégias de negócios e a considerarem o impacto de suas atividades em todas as dimensões.

No entanto, a adoção de práticas de ESG não acontece sem desafios. A inconsistência de estruturas e medições, a tensão entre impacto social e retornos econômicos, o risco de “social washing“, a falta de consenso global e a dificuldade de comparar empresas com base em relatórios ESG são apenas alguns dos obstáculos que as empresas enfrentam.

Mas empresas como a Natura, por exemplo, têm se esforçado para medir e melhorar o impacto social de suas operações, demonstrando que a sustentabilidade e a responsabilidade social podem ser mais do que apenas palavras de ordem, mas sim componentes fundamentais de uma estratégia de negócios bem-sucedida.

Apesar dos desafios, as tendências emergentes no componente social do ESG, como um foco crescente na diversidade e inclusão, um maior reconhecimento da importância do engajamento com a comunidade e um aumento na demanda por transparência nas práticas sociais das empresas, sugerem que a adoção de práticas de ESG continuará a ser uma prioridade para as empresas no futuro.

Portanto, é crucial que as empresas continuem a buscar maneiras tangíveis de avançar o “S” do ESG em suas organizações, a última fronteira – ainda pouco explorada – desse continente chamado ESG, transformando desafios em oportunidades para um futuro mais sustentável e inclusivo.

A CAUSE é uma consultoria que trabalha com ESG e programas de impacto, o que inclui:

  • Estratégia e governança para sustentabilidade;
  • Análise e benchmark para identificar gaps em ESG;
  • Estratégia de performance em ESG;
  • Cultura e engajamento em ESG;
  • Análise crítica de relatos;
  • Comunicação e reporte em ESG; 
  • Desenvolvimento e implementação de programas de impacto positivo.

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